sexta-feira, 28 de setembro de 2007

O valor de uma amizade.


Hoje pela manhã, enquanto vinha para o trabalho, uma questão não me saía da cabeça: qual o preço de uma amizade? Ou, em outras palavras, qual seria o valor mínimo que eu exigiria para abrir mão de encontrar, falar ou ter notícias de alguém que eu gosto muito?

Este raciocínio, que nada mais é do uma versão do novelístico "Quanto você quer para sumir da vida da minha filha?", não me veio por acaso.

Vamos lá. Em São Paulo, trabalhava com um cara que era bem mais do que meu dupla. Além das 12 horas diárias que passávamos roçando as pernas na agência, era comum dividirmos almoços, jantares e fins de semana na praia. Tudo sem viadagem, antes que insinuem algo.

Havia também um hábito comum: sempre que a Megasena acumulava, fazíamos apostas. Bastava bater nuns 15 milhões de reais pra gente começar a sonhar que aquele seria o nosso último (e incompleto) job. Às vezes era eu que jogava, às vezes ele. Não importava muito quem marcava os números ou pagava o jogo. O combinado era que, se um ganhasse, a grana seria igualmente dividida, estivesse eu com o bilhete ou ele.

Durante todo este tempo, imaginariamente já estudei cinema em NY, passei dois anos viajando pela Europa, comprei uma cobertura na Vila Nova Conceição e duas Sabrinas Sato pra decorar a casa. Mas sempre com metade da grana. Porque a outra metade era dele. E não fazia sentido nenhum fugir com o dinheiro e perder a amizade do cara. Continuarímos juntos. Só que em vez de rachar um copo de pinga na Vila Madalena, passaríamos a dividir o banheiro do D.O.M vomitando Romanée-Conti. Simples assim.

Em Lisboa, ainda não tinha jogado na loteria, que aqui se chama Euromilhões. Até ontem. Estava saindo do almoço com o pessoal aqui da firma e fui com um cara gente boníssima, o Luis, fazer o jogo. O processo foi o de sempre: cada um preencheu seus jogos, juntamos as moedinhas, prometemos dividir o prêmio. Pagamos e eu acabei ficando com os bilhetes. Tudo normal.

Até que, hoje de manhã, peguei um jornal gratuito na rua e logo vi: "Prêmio é de 130 milhões". De euros, meu amigo. De euros. Fiquei pensando no cara gente boníssima que eu disse. Legal, divertido, boa praça. Mas acho que ainda não fez o suficiente pra valer 65 milhões de euros. Uma coisa é meu dupla do Brasil valer 7 milhões e meio de reais. Outra coisa é outra coisa.

Desculpa, Luis, mas é a verdade. Assim que eu botar a mão na bufunfa na segunda de manhã, você nunca mais terá uma prova mínima da minha existência na Terra. No máximo, um dia, quando chegar do trabalho de madrugada e estiver zapeando a TV, você me veja de relance gastando a sua grana em Ibiza. Porque vou fazer questão de torrar sua metade primeiro. Nunca mais te verei, falarei com você ou entrarei em contato. Apagarei você da memória. É a vida.

E quer saber de uma coisa, Luis? Acho até justo. Se você fosse amigo mesmo, estaria lendo este blog, cujo endereço te passei há mais de um mês, e descobriria meu plano. Você nunca deu valor. Mas, em breve, vai descobrir que estes textos aqui valem muito. 65 milhões de euros, meu caro. Bem mais do que a sua amizade. Tudo na vida tem um preço, Luis. Tudo tem um preço.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

2nd Life


Faz exatamente dois meses que entrei no Second Life. Estava cansado do mundo real e queria começar uma vida do zero. Uma segunda vida, para ser mais exato.

Nesta outra realidade, eu poderia ter torcicolos por olhar para os lados, mas seria nas praias e não em semáforos fechados. Não passaria mais tempo no trajeto do que no destino final. E me libertaria do eterno Dia da Marmota, com o Renan Calheiros ocupando a mesma primeira página dos jornais.

Na minha segunda vida, não teria que recorrer a ansiolíticos para controlar a pressão de criar um anúncio de rodapé para a Gazeta de Ourinhos, responsabilidade comparável a de um cirurgião que abre uma artéria ou a de um sushiman que corta aquele peixe fatal que eu nunca me lembro o nome (e que tive preguiça de procurar no Google).

Como quem faz resoluções de Ano novo, prometi não trabalhar tanto, não faltar com a verdade, pedir mais desculpas e usar fio dental três vezes ao dia.

Não posso dizer que tudo deu errado e, muito menos, que a experiência não tem sido válida. Meu avatar não pode se queixar. Consegue um bom vinho com 3 unidades monetárias, tem uma Vespa novinha e acaba de ganhar uma passagem para Berlim.

Apesar de tudo isso, há dois dias ele se viu obrigado a tomar sua primeria dose de Alprozam. Não soube identificar o problema. Mas tudo indica que é mesmo com o software.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Diferenças Culturais


No Brasil, sempre que eu chegava na agência usando camisa de manga comprida, o comentário era o mesmo: "Foi mostrar pasta, né?".

Ontem cheguei aqui do mesmo jeito e me perguntaram: "Acabaram as camisetas limpas, né?"

Ambos tinham razão.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

A vista.


Acabei de me matricular numa academia aqui em Lisboa. Que, por sinal, se chama "Academia". Em menos de uma semana eu já fui lá 2 vezes: a primeira para visitar e outra para fazer a matrícula. Mas eu juro que ainda volto lá este ano.

Do lado de dentro, não há nada muito especial. Esteiras, bicicletas, aparelhos para trabalhar bíceps, tríceps e glúteos. E uma cafeteria que serve broto de bambu e queijo integral de soja. Sem sal.

Mas as semelhanças com as academias paulistanas páram por aí. Basta olhar para o outro lado da janela pra notar a diferença. Em vez do rio Pinheiros e sua marginal entupida de carros, o que se vê é uma quase indescritível vista do Tejo, que tanto inspirou Camões, Fernando Pessoa e todos aqueles caras que a gente era obrigado a ler nos resumos do Objetivo.

Uma visão quase tão sublime quanto a que eu tinha na minha antiga academia em São Paulo, onde apenas um vidro me separava da piscina semi-olímpica na qual nadava, todas as quartas, ao meio-dia e quarenta e cinco, a mulher da foto ali no alto.

Uma visão que já me inspirou muito.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Leões de Lisboa


Lisboa tem leões. No zoológico, que ainda não tive a chance de visitar, e fora dele. Ontem eles se espalhavam pela cidade: nos ônibus, metrôs, andando pelas calçadas, atravessando ruas. Em bandos pacíficos e ordeiros, bem diferente do que se vê com os porcos, gaviões e bambis em dias de jogos de futebol no Brasil.
Leões, aqui, são os torcedores do Sporting, um dos maiores times de Portugal.
Como recém-chegado, claro que me senti pressionado a escolher um time de coração, aquele pra gritar, chorar e, sobretudo, beber para comemorar as vitórias, esquecer as derrotas e lamentar (ou não) os empates.
A vantagem de escolher um time depois de velho é que você tem a chance de fazer um "test-drive" antes de assinar o contrato para uma vida de sofrimento infindável - prestando muita atenção no que dizem as letras miúdas no final da página.
No Brasil, herdei do meu pai a cidadania italiana, que me facilita um tanto a vida aqui. Em compensação, herdei também a paixão pelo Palmeiras, que dificultou as minhas manhãs pós-finais de campeonato durante mais de 20 anos.
Um inconveniente que eu não posso me dar ao luxo de repetir.
Por isso decidi que, antes de optar por um time, iria a todos os estádios. Com uma prancheta na mão para avaliar desde a arquitetura até os hinos da torcida.
E lá fui eu, ontem, ver o Sporting. Antes de mais nada, preciso dizer que estava com uma pulseirinha VIP, para que ninguém pense que a boiada é tão grande assim.
Pra começar, chegamos cerca de meia-hora antes do jogo. Sem tumulto, sem stress, sem medo de ser visto no carro com a camisa do time errado. Aliás, no carro estava o filho de 6 anos e a sogra do sujeito que me descolou a entrada VIP. Programa completamente familiar. No Brasil, conheço muita gente que levaria a sogra a um estádio lotado, mas não o filho de 6 anos.
Chegamos e estacionamos lá dentro, no subsolo. Depois pegamos o elevador, como num shopping confortável de São Paulo. Subimos e fomos parar no setor de camarotes (o 2º mais bacana, porque os bons mesmo são um andar acima). Lá havia um enorme buffet montado, com bacalhau, batatas, 200 mil sobremesas, vinho e cerveja para quem tivesse a tal pulseirinha. E olha que não era pouca gente.
Faltando 2 minutos pra começar a partida, todo mundo se dirige ao local marcado. No nosso caso, confortáveis cadeiras com espuma. Estádio mais de 80% ocupado, mesmo com o jogo sendo transmitido pela TV aberta local. Poucas emoções no primeiro tempo. Intervalo e todo mundo volta pro buffet. O segundo tempo foi um pouco melhor: expulsão do goleiro adversário, pênalti perdido e, finalmente, gol do Liedson, aquele brasileiro de algum destaque no Corinthians e que agora é rei por aqui. Palmas na hora do gol. Nada de muitos gritos. Nada da torcida inteira cantando. Tudo muito civilizado. Às vezes, exageradamente civilizado.
No final, um belo programa de domingo. Pensando friamente, acho que o Benfica vai ter que se esforçar muito para me conseguir como sócio. O jogo não foi nada incrível. Mas você precisava ter provado aquele bacalhau…